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Capital internacional no sistema de saúde brasileiro

No dia 20/01/2015, foi publicada uma alteração na principal lei que estrutura o sistema nacional de saúde brasileiro. A alteração permite a participação direta do capital internacional no sistema. Digo direta, pois indireta já há e muita, via fármacos, reagentes, hardwares e softwares para diagnósticos, entre outros.

A lei 8080 de 1990 passa a ter a seguinte redação nos artigos 23 e 53:

Art. 23. É permitida a participação direta ou indireta, inclusive controle, de empresas ou de capital estrangeiro na assistência à saúde nos seguintes casos:

I - doações de organismos internacionais vinculados à Organização das Nações Unidas, de entidades de cooperação técnica e de financiamento e empréstimos;
II - pessoas jurídicas destinadas a instalar, operacionalizar ou explorar:
a) hospital geral, inclusive filantrópico, hospital especializado, policlínica, clínica geral e clínica especializada; e
b) ações e pesquisas de planejamento familiar;
III - serviços de saúde mantidos, sem finalidade lucrativa, por empresas, para atendimento de seus empregados e dependentes, sem qualquer ônus para a seguridade social; e
IV - demais casos previstos em legislação específica. (NR)
Art. 53-A. Na qualidade de ações e serviços de saúde, as atividades de apoio à assistência à saúde são aquelas desenvolvidas pelos laboratórios de genética humana, produção e fornecimento de medicamentos e produtos para saúde, laboratórios de analises clínicas, anatomia patológica e de diagnóstico por imagem e são livres à participação direta ou indireta de empresas ou de capitais estrangeiros.

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Muitas pessoas acreditam que tal alteração é prejudicial ao componente estatal do SNS brasileiro, o Sistema Único de Saúde (SUS). Deveriam perguntar, no entanto, se do ponto-de-vista do cidadão-usuário-consumidor, uma medida que tende a aumentar a oferta de serviços e bens em saúde é algo ruim ou bom.

Parece haver uma crença na tecnocracia estatal de que a prestação de bens e serviços diretamente à população é melhor do que uma solução mais próxima ao modelo baseado na iniciativa empresarial. Não digo "livre iniciativa", pois não existe "livre iniciativa", sempre há instituições mediando, reduzindo a liberdade de iniciativa individual, em prol de uma liberdade de iniciativa estatal. Há apenas variações de intensidades e focos.

Em 2012, o IBOPE, em parceria com a Confederação Nacional da Indústria, fez uma pesquisa amostral sobre como os brasileiros avaliavam os serviços de saúde no Brasil, abaixo, alguns dos resultados.


















Dadas a trajetória social e econômica do Brasil e a conjuntura, a maioria da população brasileira depende do Estado para ter acesso a serviços e bens relacionados ao setor saúde. No entanto, a maioria afirma que a qualidade do serviço público é muito ruim. Há um forte componente do fator "renda" neste contexto, que pode ser percebido pelo fato de que, apesar de tudo, somente 1/4 das pessoas possui plano de saúde privado e que, destas, 57% o tem em função de sua relação de trabalho.

Apesar de todos os problemas existentes, incluindo o baixo valor da renda da maior parte da população, 95% dos brasileiros acreditam que é o governo deve ofertar serviços de saúde "gratuitos". No entanto, como sabemos, não há nada "grátis". Ou há individualização do custo, ou sua coletivização por meio de tributos.

Se esta alteração na lei 8080 viabilizará um incremento na oferta de bens e serviços para a população ainda é cedo para dizer, pois a conjuntura internacional não está muito favorável a este tipo de movimento e parte da tecnocracia se moverá para resistir a tais mudanças, enquanto a maior parte da população depende exclusivamente do Estado. A resultante deste jogo de forças é o que de fato será operacionalizado e implementado.
 


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