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Trinta anos sem Foucault - um segundo elogio

De 1984 até hoje o mundo mudou em várias coisas e em tantas outras continua igual.

O mundo simplista dos pró-URSS ou pró-EUA já não existe mais, se é que a simplicidade não era apenas aparente. Aparência essa determinada pelas ações dos Estados nacionais e dos Estados-partidos.

Por outro lado, apesar do mundo bipolar ser relativamente mais simples, por outro, a complexidade atual do mundo não é tão complexa assim, pois os mecanismos básicos de funcionamento da maior parte das sociedades humanas continua o mesmo.

Fica mais fácil perceber, hoje, que as ações coordenadas das grandes corporações e dos Estados são algo que constrange, que molda, que conforma a ação de indivíduos difusos ou de pequenas organizações.

Ontem a noite estava estudando coisas para o doutorado. Concluí minha releitura de "O nascimento da biopolítica", de Foucault. Iniciei a leitura do livro "O Estado, o poder, o socialismo", de Nicos Poulantzas.

Como meu objeto é ação do Estado sobre a sociedade e desta sobre o Estado, em relação ao que se chama de "saúde coletiva", ou "saúde pública", dependendo da tradição de origem, não posso escapar de estudar o Estado e sua burocracia: eu mesmo e meus colegas (apesar das diferenças funcionais em função da hierarquia e dos incentivos). Não posso cair na tentação de simplificar as coisas usando a síndrome do "nós e eles", tão recorrente por aqui.

Este segundo elogio é apenas indiretamente meu. Em primeiro grau, é um elogio de Nicos Poulantzas a Foucault. Um elogio crítico, como deve ser em qualquer relação:

"É agora que se pode ver (e aí está a contribuição original de Foucault) que o papel do Estado traduz-se na materialidade de suas técnicas de exercício do poder, consubstancial à sua estrutura própria: técnicas. que moldam os sujeitos sobre os quais se exerce o poder até mesmo em sua corporeidade." (Poulantzas, 1981, p. 78)

Logo após este elogio, Poulantzas complementa um raciocínio apresentado em "Poder político e classes sociais", fazendo a seguinte afirmação: "O individual-privado é uma criação do Estado, concomitante à sua separação relativa da sociedade como espaço público, o que não somente indica que essa separação é apenas uma forma específica da presença do Estado nas relações econômico-sociais, como também uma onipresença do Estado jamais igualada em suas relações." (ídem).

Por onde Foucault e Poulantzas nos convidariam a caminhar caso vissem a ruína do Stanilismo e o papel crucial que uma economia nacional dirigida por um grupo auto-intitulado "partido comunista", tem na manutenção do crescimento do capitalismo contemporâneo ?  E ao ver o urso acordar de sua relativa hibernação e aquele sonho contemporâneo de uma Europa entrar em crise crônica ?


 Michel Foucault




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